• 27/04/2024

O TikTok corre risco de ser banido no Brasil?

Índia e Estados Unidos. O que ambos têm em comum? Nas últimas semanas, os dois países tomaram medidas para banir o aplicativo chinês de vídeos curtos TikTok. Enquanto a Índia foi mais assertiva e já baniu de vez o app, os EUA ainda estão estudando a decisão. Segundo autoridades indianas, os aplicativos chineses podem ser utilizados para obter dados dos usuários. Já os Estados Unidos estão estudando a decisão. Em 2019, o TikTok foi o terceiro aplicativo mais baixado no mundo.

Mas e no Brasil? Existe alguma possibilidade de o aplicativo ser impedido de funcionar?

A resposta é: talvez. Não, porque por aqui a proibição, como aconteceu na Índia, não pode partir do governo. E sim porque as gigantes de tecnologia e fabricantes dos smartphones mais usados no Brasil podem proibir o aplicativo em suas respectivas lojas se acabarem concordando que o TikTok viola alguma política de segurança. “No Brasil não existe o bloqueio de aplicativos. Agora, existem aplicativos que são ilegais, que não podem ser disponibilizados na App Store ou na Play Store. Então, se o app for considerado ilegal, ele não pode ser baixado aqui. Mas o Bolsonaro, com uma canetada, não é capaz de bloqueá-los”, explica Fabro Steibel, diretor executivo do Instituto Tecnologia Social (ITS).

O Brasil, como país, nunca conseguiu banir um aplicativo de vez. Em 2015 o WhatsApp foi alvo de proibições que deveriam acontecer por 48 horas, mas que acabaram durando somente treze. Outros apps, como o FaceApp, que desde 2017 é acusado de ter uma política invasiva e problemática, não foram proibidos em terras brasileiras apesar das brechas nos termos do app. Apesar disso, a Apple e o Google foram multados por veicular aplicativos do tipo em suas plataformas. “Além do Código de Defesa do Consumidor, o Marco Civil da Internet também traz regras que podem afetar a continuidade do TikTok no Brasil”, afirma Adriano Mendes, especialista em direito digital e sócio no escritório Assis e Mendes.

Sobre a acusão indiana, o TikTok afirmou que “o aplicativo não tem outra prioridade se não promover uma experiência de aplicativo segura e confiável para nossos usuários” e nega que ter fornecido dados para o governo da China, como fora acusado. “O TikTok é liderado por um CEO americano, com centenas de funcionários e líderes-chave em segurança, produtos e políticas públicas nos EUA”, disse a empresa.

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Para Steibel, a motivação para a proibição na Índia é diferente da dos EUA. Enquanto a Índia está preocupada com a soberania do país, o foco dos americanos pode estar muito mais na proteção dos usuários abaixo de 13 anos — apesar de o TikTok afirmar que não existe um foco em um público específico, a maior concentração de usuários está entre jovens e adolescentes. A possível razão para isso é que a rede social se assemelha ao Snapchat, usado por usuários com idades entre 18 e 34 anos – segundo dados da consultoria eMarketer. 

“É um movimento novo, mas se tem essa ideia de que, ao você ter aplicativos que coletam dados a tantos momentos, e se você der esses dados a outro país, você estará ameaçando a soberania do seu próprio país. E o que está dentro desse tema de soberania?”, questiona Steibel. “Você tem o reconhecimento facial, o TikTok tem um percentual alto de reconhecimento da população indiana e brasileira. Não é tão diferente da coleta que o Instagram faz, por exemplo, mas a simbiose com o governo chinês cria um uso para esses dados que não é o mesmo utilizado pelo Facebook, que não compartilha os dados com o governo americano. E aí você tem a soberania ameaçada”, diz Steibel.

O TikTok nega que cede informações dos usuários para o governo chinês. “Nunca fornecemos dados dos usuários ao governo chinês e nem o faríamos se solicitado”, disse a empresa em comunicado.

Mas, segundo Mendes, pelas regras da China, o governo chinês tem uma participação societária “ou acesso aos sistemas de quase todos os negócios”. “Assim, em teoria, o Governo Chinês pode ter acesso a dados de residentes em outros países, quando tais dados são recebidos e tratados nos servidores localizados na China”, diz.

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Essa, no entanto, não foi a primeira vez que o app foi proibido na Índia. Em abril do ano passado, o TikTok foi proibido temporariamente no país com a justificativa de ser muito expositivo para crianças e adolescentes, especialmente em temas como bullying e violência. Com isso, o app acabou perdendo 15 milhões de usuários.

Já nos Estados Unidos, a proibição pode se dar muito mais para proteger os dados dos mais jovens. “Nos EUA, é preciso lembrar que a maioria dos usuários são menores de idade e por lá existem regras muito restritas sobre isso. A regulamentação lá de coleta de dados para menores de 13 anos é muito rigorosa e o TikTok trabalha muito com essa faixa etária”, explica Steibel.

O mesmo pode impulsionar uma eventual proibição no Brasil. “Já existe um inquérito do Procon para investigar questões relacionados à publicidade direcionada para crianças e adolescentes e também outras investigações que tratam sobre a quantidade e tipos de informações que o aplicativo coleta, sem conhecimento do titular ou sem a necessidade do seu uso para as funções visíveis do aplicativo. Por exemplo, qual é a finalidade de coleta da geolocalização ou do histórico do acesso às chamadas?”, conta Mendes.

Dados ou mercado?

Mas os EUA também podem estar preocupados com outro fator e um eventual banimento do app no país pode ter mais a ver com a guerra comercial com a China do que com a proteção de dados. Se até o Reino Unido entrou na dança e baniu a chinesa Huawei de suas redes 5G, resta saber o que aconteceria com o TikTok. “Não é possível dizer que com o banimento do TikTok os usuários da plataforma voltarão a utilizar o Facebook ou Instagram, mas – assim como no caso da Huawei e 5G, esta pode ser parte da visão estratégica do governo americano para privilegiar suas empresas e manter a hegemonia dos aplicativos ao redor do mundo”, diz Mendes. “Exceto Huawei, Alibaba, WeChat e poucas outras empresas de tecnologia, grande parte dos serviços que usamos diariamente para coleta ou tratamento de dados já estão regidos ou têm controle vinculado às leis americanas.”

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Steibel discorda. Para ele, um dos maiores exemplos para isso é o monopólio dos dispositivos iOS e Android no mundo todo, ambos de marcas americanas. “Várias empresas chinesas, com a proibição do Trump, estão anunciando que criarão seus próprios sistemas operacionais. Com isso, deve-se ver uma queda no monopólio do Google. Mas esse fator que existe é uma caracteristica desses mercados, a gente viu isso com o Windows, com os celulares… há uma tendência de poucas empresas de tecnologia dominarem alguns ramos”, explica. 

A ideia do TikTok é tentar achar alguma forma de reverter o banimento. “Embora o governo da Índia tenha emitido uma ordem provisória para bloquear 59 aplicativos, a equipe da ByteDance [controladora do TikTok], de cerca de 2.000 funcionários no país, está comprometida em trabalhar com o governo para demonstrar nossa dedicação à segurança do usuário e nosso compromisso com o país em geral”, disse a companhia.

Sair da China resolve?

Para Mendes, eventualmente sair da China para driblar o mercado pode ainda não ser uma solução a curto prazo. “Isso não basta. Iniciada as investigações, o TikTok deverá comprovar que não teve ingerência do governo chinês e que cumpre as legislações protetivas dos países em que atua. Somente assim não haverá a possibilidade de manutenção do bloqueio nos países ocidentais, que não censuram a comunicação e a internet”, explica. “No Brasil, o direito ao livre acesso e à manifestação está previsto na nossa Constituição, Nos Estados Unidos na Primeira Emenda. Ou seja, levando o caso para os tribunais, é possível manter o aplicativo online, mas a gerra jurídica e decisão de governos pode chamuscar e matar o desenvolvimento do aplicativo.”

Se isso vai dar em algo? É díficil saber. Mas as coisas (que estavam tranquilas como vídeos de cachorrinhos no aplicativo) não estão mais tão facéis para o TikTok.

(Portal Exame)

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