Outro dia estava sentada esperando minha filha sair de uma atividade quando ouvi um papo do grupo de mães ao lado. Uma delas dizia que não queria mudar o filho de esporte para não ser “a mãe chata”. Na mesma semana, uma amiga me contou que tinha permitido a filha fazer algo porque não queria ser “a mãe chata”. Achei curiosas essas duas cenas e fiquei refletindo: desde quando impor limites ou tomar decisões é ser chata?
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Mas, então, me dei conta que essa narrativa é muito comum. Tão comum quanto injusta. Lembrei que ouvia minha mãe dizer: “Seu pai deixa tudo e eu sou a chata”. E sei que eu mesma me senti assim diversas vezes. A última foi quando minha filha de doze anos pediu para almoçar com os amigos perto da escola. Eu permiti com a condição de acompanhá-la no trajeto, já que ela não andava sozinha na rua ainda. Fui a chata da vez. E me senti mal por isso, embora convicta da minha decisão.
Não sou psicóloga, não estudei psicanálise, mas vou arriscar aqui um comentário a partir das minhas reflexões e sensações. Deixar de tomar decisões em que acreditamos por medo de sermos taxadas de chata talvez explicite alguma insegurança em relação a esse amor entre mães e filhos. Será receio de não ser mais o centro afetivo dessa criança? Será carência emocional, uma necessidade de beber na fonte desse afeto filial que parece inesgotável, mas que se consolida também com a demonstração de cuidado e limite, com os embates e desacordos?
“O ‘não quero ser a chata’ muitas vezes encobre o nosso incômodo de ter de se posicionar, brigar, contrariar…”
Segue o fio comigo: nos intitular de chatas é perpetuar uma mentira injusta, mas pode ser também desviar de responsabilidades. O “não quero ser a chata” muitas vezes encobre o nosso incômodo de ter de se posicionar, brigar, contrariar… Ou seja, para não discordar dos filhos, ficamos em cima do muro em nome do “sou a mãe legal”. Já pensou sobre isso?
Essa depreciação esconde também um contexto indiscutível: não somos chatas, estamos sobrecarregadas. Talvez se as mulheres pudessem dividir mais as responsabilidades, as resoluções, os afazeres, elas não se sentiriam tão exaustas. Temos um nome para isso: fadiga de decidir.
Proponho que a gente mude essa narrativa. Que a gente deixe de lado essa autodepreciação, que sejamos mais gentis com nós mesmos. Não somos chatas. Como escreveu bell hooks em seu livro Tudo Sobre o Amor: “Abraçar uma ética amorosa significa abraçar todas as dimensões do amor – cuidado, compromisso, confiança, responsabilidade, respeito e conhecimento – em nosso cotidiano”. Então, quando achar que está sendo chata, peça ajuda, divida a carga e lembre-se que você está “apenas” desempenhando seu papel.