• 22/11/2024

Transtornos mentais são 1ª causa de perda de anos de vida saudável entre crianças e jovens, diz estudo

Os transtornos mentais representam hoje a principal causa de anos de vida saudável perdidos por crianças, adolescentes e jovens, mostra estudo internacional que usou dados de 156 países, inclusive do Brasil.

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Publicado nesta quarta-feira (31) na revista Jama Psychiatry, o trabalho liderado por um pesquisador da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) mostra que 11,63% das pessoas entre 5 e 24 anos (293 milhões) apresenta pelo menos um transtorno mental.

O estudo usou o banco de dados internacional GBD (Global Burden of Disease), que reúne todas as pesquisas já publicadas, relatórios e dados de ministérios da saúde de diferentes países.

Na pesquisa, não há dados em separado do Brasil (eles serão publicados em outro trabalho científico ainda em curso). Mas, segundo os pesquisadores, a prevalência é parecida. Estima-se 10 milhões de jovens brasileiros entre 5 e 24 anos tenham ao menos um transtorno mental.

Esse conjunto representa no grupo estudado a maior causa de anos vividos com incapacidade entre todas as condições de saúde, como doenças cardiovasculares, diabetes, câncer e lesões não intencionais.

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Considerando o número de anos vividos com incapacidade por transtornos mentais ao longo de toda a vida, 25% ocorrem no período de 5 a 24 anos. Os três transtornos com maior impacto em cada uma das faixas etária estudadas foram os seguintes:

● Entre crianças (5 a 9 anos): transtornos de ansiedade, transtorno de conduta e deficiência intelectual

● Entre pré-adolescentes (10 a 14 anos): transtorno de conduta, transtornos de ansiedade e transtornos depressivos

● Entre adolescentes (15 a 19 anos): transtornos depressivos, transtornos de ansiedade e transtorno de conduta

● Entre adultos jovens (20 a 24 anos): transtornos depressivos, transtornos de ansiedade e transtornos por uso de drogas

“Os transtornos mentais têm seu impacto cedo no ciclo vital e a incapacidade gerada nessa idade precoce pode repercutir de modo negativo na transição para a vida adulta”, diz o psiquiatra Christian Kieling, professor da UFRGS e líder do estudo.

Entre as condições investigadas, os transtornos de ansiedade apresentaram a maior prevalência (84 milhões, ou 3,35% da população estudada), e a esquizofrenia, a menor (2 milhões ou 0,08%).

Os dados mostram um aumento de transtornos de humor no início e no final da adolescência. A prevalência da ansiedade é de 1,32% entre 5 e 9 anos; passa para 3,35% entre 10 e 14 anos e sobe para 4,34% entre 15 e 19 anos. Já a da depressão, de 0,08%, 0,98%, 2,69% e 3,85% respectivamente.

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A prevalência das doenças varia de acordo com a faixa etária e o gênero. Por exemplo, o transtorno de déficit de atenção/hiperatividade é mais frequente entre os meninos e há um pico entre os 10 e 14 anos, com queda nas idades subsequentes.

Já os transtornos depressivos afetam mais as meninas, com um aumento constante ao longo de todo período avaliado. “A gente tem diferentes grupos de transtornos apresentando padrões diferentes de surgimento e de impacto na vida das crianças e adolescentes”, diz o médico.

Kieling reforça a importância de se reconhecer o papel das diversas mudanças que ocorrem em ritmo acelerado no período da infância e da adolescência (por exemplo, maturação do cérebro, puberdade, demandas sociais e transição para a força de trabalho).

Segundo ele, os resultados sugerem que as ações de prevenção e as intervenções em saúde mental precisam começar muito cedo e é fundamental que elas reconheçam as peculiaridades de cada etapa da vida dos jovens.

“Do ponto de vista epidemiológico, talvez não seja tão importante fazer um programa focado em depressão em crianças pequenas. Ou focar em TDAH no final da adolescência e no início da vida adulta não seja tão relevante quanto fazer isso mais cedo.”

Para ele, é importante que as políticas de saúde levem em conta o perfil de cada faixa etária na organização dos serviços de saúde. “Não dá para falar em uma prevalência única. Existem muitas prevalências que vão aumentando em cada etapa do desenvolvimento.”

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De acordo com o psiquiatra, a linha imaginária de considerar a pessoa adulta aos 18 anos não faz sentido na saúde mental. “Tanto a partir do que a gente conhece do desenvolvimento do cérebro quanto sob o ponto de vista do que a gente sabe das questões psicológicas e sociais.”

Ele conta que já presenciou situações de jovens atendidos em ambulatórios de saúde mental voltados à infância e adolescência que, no meio do caminho, completaram 18 anos e tiveram que recomeçar o percurso em um serviço para adultos.

“Temos uma fragmentação dos serviços justamente no período em que há a maior incidência de transtornos mentais. Não faz nenhum sentido.”

Na sua opinião, a despeito de todos os avanços ocorridos no SUS e na atenção primária, os jovens e suas questões de saúde mental continuam não sendo enxergadas pelas políticas públicas. “A atenção primária está muito focada nas doenças físicas, não se fala em saúde mental proporcionalmente ao que elas já representam na carga de doenças.”

Na Austrália, por exemplo, os serviços de atenção primária incluem, além da saúde física, o cuidado às questões de saúde mental e aos aspectos vocacionais. “Não fala só de saúde. Fala também de promoção, de desenvolvimento, há espaços focados nos jovens”, diz o médico.

(Folha de São Paulo)

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