A vida online está começando cada vez mais cedo para as crianças brasileiras. Em 2015, entre os internautas de 9 a 17 anos, 11% haviam acessado a internet pela primeira vez até os 6. De lá para cá, esse número foi crescendo e mais do que dobrou. Atualmente, são 24% os que começaram a vida digital na primeira infância.
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Já o número daqueles que dão início ao acesso às redes quando estão mais velhos vem se reduzindo. Em 2015 eram 15% os que haviam entrado na internet pela primeira vez depois dos 12 anos. Em 2023, são 7%. O número daqueles que não lembram quando começaram a vida digital também aumentou, de 12% para 19%, o que pode indicar que mais crianças tenham iniciado no universo online quando eram muito pequenas.
A pesquisa considera acessos feitos por meio de computadores, TVs, celulares e videogames.
Os resultados apontam para um uso cada vez mais precoce da internet, o que pode trazer prejuízos ao desenvolvimento cognitivo, físico e à saúde mental, entre outros, na visão de especialistas. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que bebês de até dois anos não tenham acesso às telas e que crianças de até cinco anos sejam expostas a elas, no máximo, uma hora por dia, e com conteúdo controlado pelos pais.
Um outro dado da pesquisa revela que a internet está ganhando espaço com os mais novos, especialmente após a pandemia e o fechamento prolongado das escolas no Brasil. O número de usuários de 9 e 10 anos subiu quase 40%. Em 2015, eram 63% da população brasileira nessa faixa etária; em 2023, já são 87%.
“A partir das evidências desse uso cada vez mais precoce, a sociedade precisa debater como garantir os direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes, considerando também o ambiente digital”, afirma à Folha Luísa Adib, coordenadora da pesquisa. “É preciso garantir a privacidade e a proteção dessa população. Temos que pensar em como proteger a infância e a adolescência brasileiras na era digital.”
O maior crescimento do uso de internet na infância e na adolescência se deu na classe DE, que passou de 56% em 2015 para 89% em 2023. Na classe C, também subiu, de 87% para 97%. Na AB, o uso já era generalizado e se mantém estável, perto de 100%.
Os hábitos digitais devem acender um alerta para pais e educadores. Atividades ligadas ao consumo estão em alta, como a pesquisa para comprar produtos, feita por 61% das crianças e jovens, e mesmo as compras, realizadas por 22%. Na enxurrada de propaganda direcionada por algoritmos, 84% ficam com vontade de ter algum produto e 73% se sentem chateados quando não podem comprá-lo.
Menos da metade dos pais (43%) dizem conversar com os filhos sobre as propagandas que eles veem e lhes explicam o objetivo desse tipo de conteúdo. Apenas 28% utilizam filtros ou configurações para restringir o contato das crianças com publicidade.
Outros dados preocupantes: 16% afirmam ter recebido mensagens de conteúdo sexual e 9% viram imagens sexuais e já tiveram pedido de foto ou vídeo em que aparecem pelados.
Sem noção dos riscos, 31% das postam ou compartilham o local onde estão, segundo a pesquisa.
Chama a atenção a busca crescente, no pós-pandemia, por informações sobre sentimentos, sofrimento emocional, saúde mental e bem-estar: 34% fazem isso atualmente, ante 17% em 2021. A procura por informações sobre medicamentos também aumentou, de 17% em 2021 para 25% neste ano.
Crianças e adolescentes dominam habilidades para utilizar a internet do ponto de vista técnico: baixar aplicativos (96%), conectar-se a uma rede wi-fi (93%) e salvar uma foto (91%), por exemplo. Dizem saber quais informações devem ou não compartilhar (83%) e reconhecer quando alguém está sofrendo bullying (81%). Mas fica evidente que desconhecem a complexidade do universo digital quando a metade diz acreditar que a primeira publicação que vê nas redes sociais é a última postada pelo seu contato –e não uma imposição do algoritmo a partir de informações coletadas do usuário.
Além disso, 47% dizem crer que todos encontram as mesmas informações quando realizam a mesma pesquisa e 40% confiam que o primeiro resultado de uma busca é sempre a melhor fonte de informação, sem entender o papel dos algoritmos.
(Folha de São Paulo)